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Foto do escritorAbel Forlino

Conhecendo os cortes wagyu para obtenção de uma desossa eficiente



Quando alguém pensa em um bife wagyu, a primeira coisa que vem à cabeça do imaginário coletivo é um bife de excelente qualidade, com um marmoreio formidável. No entanto, para que se chegue a esse resultado final, primeiramente deve-se conhecer a anatomia do bovino, juntamente com as qualidades extrínsecas da carne wagyu, que é diferente em relação às outras raças em termos de marmoreio e desenvolvimento muscular devido à sua genética, manejo e nutrição, uma vez que são animais que vão para o abate entre os 26 e 30 meses de vida, com um peso que varia de 750 kg a 850 kg. Essas características que fazem com que essa raça seja tão especial transcendem em decorrência do renome de seus cortes cárneos e de seus variados graus de marmoreio. Esse marmoreio, em relação à palatabilidade, é importante, pois potencializa a tenrura, aprimora a suculência e realça o sabor.


A gordura intramuscular, que contribui com as propriedades da carne wagyu, se encontra em um grau mais elevado ou menos intenso em cada músculo, tendo relação direta com a função mecânica e fisiológica deste, sendo também responsável pela demanda de energia. Por sua vez, a presença de diferentes tipos de ácidos graxos saturados ou insaturados varia de acordo com o tipo de músculo.


Neste artigo técnico, faremos uma breve recapitulação de alguns dos cortes cárneos mais conhecidos do gado wagyu, de sua composição de gordura, bem como do impacto direto desta no marmoreio.


Desossa e cortes cárneos wagyu



Define-se a desossa como a técnica de divisão do animal em cortes cárneos, a qual determinará o uso futuro da carne, que em seguida será embalada ou não em cortes pequenos e grandes. Para que se realize corretamente a desossa do gado wagyu, deve-se conhecer com riqueza de detalhes os cortes que possuem valor e relação com o grau de marmoreio e os que não se encaixam nestas características. As consequências de uma desossa prolongada podem ser observadas logo de cara, impactando na apresentação do produto e na lucratividade do negócio; além disto, uma desossa bem executada acarreta a menor quantidade possível de carne no osso.

Os cortes wagyu mais conhecidos e que são mais frequentemente procurados são os bifes anchos (Nota do Tradutor: do espanhol, grossos) e angostos (N.T.: finos), miolo de costela e lombo. Outros cortes menos conhecidos encontrados no quarto-dianteiro e que têm um elevado teor de marmoreio e sabor são a marucha (N.T.: localizada na parte dianteira do bovino) [ou tapa de paleta – no Brasil, genericamente conhecida como picanha], cujo nome nos Estados Unidos é flat iron; o oyster blade (também conhecido como paleta ou blade, o qual é outro corte com uma característica especial para se fabricar embutidos. Outro que também é popular no país norte-americano é o brisket ou peito, muito apreciado pelos apaixonados pelo barbecue/churrasco.


Esses cortes são apenas a ponta do iceberg do que a raça wagyu pode oferecer; além disso, é importante estar a par dos cortes e de seus teores de marmoreio para que se ensine aos consumidores como aproveitar esta carne em seu nível máximo de expressão, incentivando-os, também, a experimentá-la. Somado a isso, existe todo um percurso de desenvolvimento culinário que vem evoluindo à medida que o wagyu desembarca em novos países e culturas, nos quais se funde com sabores e receitas regionais.


Gordura de revestimento


A palavra “gordura” causa uma má impressão em algumas pessoas. No entanto, existem vários tipos de gorduras e diversos ácidos graxos, e, conforme sua composição lipídica, essas variedades causam um efeito negativo maior ou menor na saúde do consumidor. A carne wagyu possui um alto teor de ácidos graxos insaturados e um perfil de gorduras “boas”, melhor do que o de outras raças, com destaque para um ótimo equilíbrio entre ácidos ômega 3 e 6.



Para muitos criadores, a gordura (sobretudo a dorsal) é importante, pois é ela que vai determinar se uma vaca poderá passar um inverno com escassez de suprimento forrageiro sem que tenha sua vida posta em risco. A gordura do animal se distribui ao longo do músculo e pode se movimentar caso haja necessidade de energia.


Além disso, a gordura subcutânea localiza-se debaixo do couro, é dura, depositária, ou de revestimento, que se desenvolve com o auxílio de ácidos graxos insaturados e, em grande parte, saturados (SFA, na sigla em inglês). É importante que se preste atenção a essa “capa de gordura”, pois essa informação propicia mais dados sobre a cria do animal em termos nutricionais e se ele apresentou ou não restrições alimentares.


Em relação à gordura intramuscular, que é bastante procurada pelos consumidores, ela se transforma e se funde repentinamente, para fornecer energia aos músculos. Isso se deve ao fato de que o gado wagyu vem sendo usado há séculos como animal de tração, e sua evolução genética teve como embasamento a seleção darwiniana de animais que conseguiram resistir nas culturas de plantação de arroz ou no transporte de mercadorias. Sua gordura intramuscular era um combustível de rápido acesso para os músculos. Consequentemente, os vários anos de seleção natural desse tipo de animal, que o deixou resistente ao trabalho, favoreceram o aumento do teor de gordura intramuscular em suas proles.


Biologia do marmoreio


O marmoreio é constituído por grupos de células individuais (adipócitos estriados), que estão localizados dentro do tecido conjuntivo perisimial, entre feixes de fibras musculares (fascículos). Contudo, no músculo Longissimus dorsi do wagyu preto de origem japonesa e classificação A5 (grau mais alto de qualidade no Japão), foram observados adipócitos estriados dentro dos conjuntos de músculos, indicando que esse tipo singular de células de fibroblastos que compõem o tecido conjuntivo perisimial pode se diferenciar em adipócitos estriados. A presença de adipócitos estriados no músculo de animais pretos japoneses, juntamente com a quantidade expressivamente reduzida de miofibrilas por feixe, sugerem a conversão (transdiferenciação) de células musculares (células-satélite) para adipócitos por um mecanismo até hoje desconhecido. Esse fato sugere que isso poderia ser um fenômeno fisiológico incomum que ocorre somente em determinadas raças de gado bovino. Um dos fatores desencadeantes seria a presença de ácido oleico na gordura, embora o mecanismo de ativação de transdiferenciação das células musculares em adipócitos ainda não tenha sido identificado. Apesar disso, um estudo de Chung e Johnson (2009) demonstrou que a combinação de ácido oleico e fatores de crescimento causa a transformação das células do músculo bovino em adipócitos, o que pode explicar o estriamento intenso na carne de gado wagyu.


Desenvolvimento do marmoreio e ácidos graxos monoinsaturados


Existe uma correlação significativa entre a concentração de ácidos graxos monoinsaturados (MUFA, na sigla em inglês), como o linoleico, e a quantidade de lipídios intramusculares no músculo Longissimus dorsi (CHUNG et al., 2006b; SMITH et al., 2006). Isso é expresso de forma evidente no gado bovino com propensão genética para o marmoreio que se alimenta com dietas à base de grãos durante períodos muito longos. As dietas à base de grãos também elevam os MUFAs em termos de marmoreio ao estimularem a expressão de esterol na coenzima A desaturase (SCD).


Especificamente, a carne do peito do boi wagyu é um corte que, em sua gordura, possui uma elevada quantidade de ácido oleico, com maior índice de MUFA e menor teor de ácido esteárico, ao passo que o corte vacío tem uma quantidade maior de ácido esteárico e menor de oleico. A pastagem diminui a ativação do gene SCD, que impulsiona o marmoreio em comparação com os bezerros alimentados com milho. Este fato científico dá respaldo aos dados originários de estudos anteriores, que relataram que a carne proveniente de animais alimentados com pastagem tem mais SFA e queda maior em MUFA do que a carne bovina com dieta de grãos (CHUNG et al., 2006b; LEHESKA et al., 2008; DUCKETT et al., 2009; ADAMS et al., 2010). Para finalizar, os cortes com maior teor de marmoreio têm uma quantidade maior de MUFA, o que indica que apresentarão efeitos melhores na saúde do consumidor.



Conclusão


O wagyu se destaca em relação às outras raças pelo seu alto grau de marmoreio, e o aproveitamento das qualidades especiais deste tipo de bovino consegue potencializar ainda mais a experiência gastronômica. Para que isso aconteça, é importante conhecer e estudar os cortes que contêm marmoreio, realizar uma desossa perfeita, ter ciência de seus pontos de cozimento e compreender os pontos de fusão de sua gordura, que vão variar de acordo com os tipos de ácidos graxos e de gordura. Para maximizar essa característica, os produtores têm que escolher seus animais com base no teor de marmoreio destes e, além disto, sempre ter como foco a obtenção de uma consistência no produto final.


Referências


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Abel Forlino

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